(Lembranças do padre Zdzislaw Malczewski SChr
Foz do Iguaçu situa-se no estado do Paraná, na fronteira de três países da América do Sul: Brasil, Argentina e Paraguai. A cidade conta mais de 260 mil habitantes. Um número significativo dos moradores se dedica à prática do comércio com a vizinha cidade paraguaia de Punta del Este, onde pode ser adquirido um grande número de produtos de diversas regiões do mundo. Esse comércio favorece o contrabando para o lado brasileiro de armas e drogas, o que infelizmente contribui para o crescimento da criminalidade naquela cidade. Mas, para a maioria dos turistas nacionais e procedentes de diversas partes do mundo, o nome Foz do Iguaçu se associa com as famosas cataratas. Trata-se de um conjunto de cerca de 275 cataratas no rio Iguaçu (na bacia do rio Paraná), situado entre o Parque Nacional do Iguaçu, no estado do Paraná, no Brasil, e o Parque Nacional do Iguazú em Misiones, na Argentina, na fronteira entre esses dois mencionados países. A área total de ambos os parques corresponde a 250.000 hectares de florestas subtropicais e é considerada patrimônio natural da humanidade.
As famosas cataratas foram incluídas entre as 7 maravilhas da natureza e distam de Curitiba, capital do estado do Paraná, cerca de 700 quilômetros. O Parque brasileiro do Iguaçu possui mais de 185 mil hectares e é registrado pela UNESCO como patrimônio natural da humanidade. Vale a pena ainda mencionar que em Foz do Iguaçu encontra-se o Parque das Aves, que se situa nas proximidades das cataratas do rio Iguaçu e possui 16 hectares de mata nativa, na qual vivem 1.500 animais de 140 diversas espécies, incluindo aves, répteis e mamíferos.
No dia 15 de abril de 2023 embarquei em Porto Alegre num voo de três horas a Foz do Iguaçu por São Paulo, mas não com fins turísticos. No passado tive por diversas vezes a possibilidade de estar naquela cidade, para mostrar a diversas pessoas da Polônia a beleza e a riqueza das cataratas, bem como o parque das aves tropicais. Dessa vez viajei a Foz do Iguaçu para à noite celebrar uma santa Missa no aniversário dos 100 anos da morte do ornitólogo polonês Tadeusz Chrostowski, que durante a sua terceira expedição ao Brasil contraiu na selva (que pertence atualmente ao Parque Nacional do Iguaçu) a malária, juntamente com toda a sua equipe. De todo o grupo, somente Tadeusz Chrostowski não conseguiu salvar a vida. Os membros da equipe foram salvos. Eles foram transportados, do lugar em que contraíram a doença até Virmond, distante cerca de 300 quilômetros, onde o médico polonês Józef Czaki – além de muitas outras tarefas – participava também do combate da cólera no Paraná.
Voltando ao nosso compatriota, ele é considerado no Brasil o precursor da ornitologia de campo e o patrono da ornitologia paranaense, mas nos círculos mais amplos da sociedade brasileira ainda é pouco conhecido. A sua figura, as suas pesquisas científicas, os contatos com os colonos poloneses no estado do Paraná restringem-se antes a um pequeno grupo de especialistas que se dedicam à ornitologia ou à história.
Em foz do Iguaçu surgiu um grupo específico composto de intelectuais e jornalistas fascinados pela figura e pelos frutos das pesquisas de Tadeusz Chrostowski. Um dos principais objetivos da associação oficialmente fundada é não somente a popularização das realizações científicas de Tadeusz Chrostowski, mas atualmente a proposta da preservação do túmulo do famoso pesquisador da fauna paranaense e a edificação de um jazigo em forma de pirâmide, que outrora havia sido colocada no túmulo do nosso compatriota fascinado pela fauna paranaense. A título de esclarecimento informo que o túmulo de Tadeusz Chrostowski, encontrado após anos de buscas, encontra-se na área do Parque Nacional do Iguaçu.
É justamente esse grupo de brasileiros da cidade de Foz do Iguaçu que procura tornar memorável a figura desse polonês que nas selvas paranaenses pesquisou a rica diversidade das aves locais.
Por iniciativa do mencionado grupo de brasileiros foi planejada uma Missa por ocasião do aniversário dos 100 anos da morte de Tadeusz Chrostowski na igreja de Bom Jesus Imigrante, onde exerce a função de pároco o scalabriniano Pe. Albino Matei. O simpático religioso recebeu-me com muita amabilidade. Antes do início da celebração, começaram a aparecer na igreja a pessoas envolvidas na liturgia da santa Missa. Tive a possibilidade de conversar com diversas pessoas sobre as quais fiquei sabendo durante a prévia troca de correspondência com um dos membros do mencionado grupo, que me informou sobre o transcurso dos preparativos, bem como sobre as pessoas engajadas na celebração do aniversário da morte do naturalista polonês e no projeto da construção do monumento, que já se encontra numa etapa bastante avançada. Alegrei-me muito quando vi um grupo de jovens polônicos em trajes folclóricos cracovianos com o Geraldo Zapahowski (pesquisador da colonização polonesa no município de Virmond), que haviam vindo daquela localidade especialmente para a mencionada Missa. Na mencionada cidade e no município, a maioria dos habitantes é de pessoas de origem polonesa. Funciona e atua ali o conjunto folclórico denominado “Mali Polacy” (Pequenos poloneses). Em Virmond atua também um núcleo se Representação Central da Comunidade Brasileiro-Polonesa (Braspol).
A santa Missa na igreja de Bom Jesus Imigrante iniciou-se com a entrada do grupo de Virmond. Na procissão ao altar os jovens polônicos levavam uma imagem de Nossa Senhora de Monte Claro, um gobelino com a Águia Branca e uma bandeira polonesa. Os mencionados símbolos foram deixados pelos jovens em lugares especialmente preparados na frente do santuário.
A seguir iniciou-se a procissão litúrgica. Atendendo ao desejo do pároco local, a santa Missa foi presidida pelo reitor da Missão Católica Polonesa no Brasil e ao mesmo tempo autor desta reportagem. Uma das participantes do grupo acima mencionado que se concentra na figura de Tadeusz Chrostowski realizou a introdução à solene liturgia. A seguir o Prof. Fernando Straube, biólogo e divulgador da figura e das realizações científicas do nosso compatriota naturalista e ornitólogo, apresentou aos participantes da Missa o aspecto histórico vivenciado por ocasião do aniversário dos 100 anos da morte de Tadeusz Chrostowski. Ele apresentou também um esboço biográfico do nosso compatriota. A seguir o celebrante e presidente da santa Missa, após a saudação litúrgica dos fiéis, expressou a sua alegria por ter vindo a Foz do Iguaçu para juntamente com os presentes no santuário celebrar a Missa pelo pesquisador polonês da fauna paranaense.
Da Liturgia da Palavra participaram ativamente os fiéis, e o Pe. Albino leu o Evangelho. A seguir o reitor da Missão Católica Polonesa no Brasil pronunciou o seu sermão, que envolveu três acontecimentos celebrados naquela liturgia da Santa Missa, a saber: a fé de S. Tomé em Jesus ressuscitado quando pôde tocar as marcas da Sua paixão e a influência desse acontecimento na nossa vida cristã; a Misericórdia Divina, da qual necessita hoje a desencaminhada coletividade humana (foram apresentadas as palavras de S. João Paulo II de 21 anos passados, quando consagrou o Santuário da Misericórdia Divina em Cracóvia-Łagiewniki); a fé e a profunda convicção de Tadeusz Chrostowski no sentido das pesquisas realizadas nas tropicais matas paranaenses, promovidas com recursos muito limitados e extremas dificuldades. No final da sua reflexão o pregador expressou a gratidão ao pároco local Pe. Albino, bem como às pessoas envolvidas na preparação da Missa especial por Tadeusz Chrostowski no centésimo aniversário da sua morte.
Na Oração dos Fiéis, a equipe dirigente da liturgia da Missa inseriu as intenções propostas pela Introdução aos Ritos do Missal Romano e incluiu o falecido pesquisador polonês e os outros participantes poloneses da terceira expedição de Tadeusz Chrostowski, que com as suas viagens científicas ao Brasil contribuíram para o melhor conhecimento da fauna e da flora brasileiras. Foram também elevadas preces pelos familiares dos falecidos pesquisadores poloneses, que atualmente vivem na Polônia.
Na procissão das oferendas os representantes da juventude levaram até o altar um grande retrato de Tadeusz Chrostowski com o uniforme do exército polonês, bem como fragmentos da placa que estava situada na pirâmide do sepulcro do pesquisador prematuramente falecido. Nessa placa havia uma inscrição em língua polonesa. Infelizmente a placa foi destruída por vândalos ou pela polícia no período da nacionalização introduzida em 1938 pelo presidente do Brasil Getúlio Vargas. Naquele difícil período eram destruídos nos lugares públicos (lojas, pedras tumulares, escolas, associações) todas as inscrições em línguas estrangeiras. E foi justamente no Paraná que as restrições nacionalizadoras foram promovidas com mais intensidade que em outros estados do País.
No final da santa Missa o Padre Albino agradeceu aos organizadores da oração comum e a todos os presentes no santuário pela presença e participação na solenidade. Uma representante do grupo engajado na preservação da memória do ornitólogo polonês Tadeusz Chrostowski também dirigiu aos presentes palavras de agradecimento, e de maneira especial ao pároco local e ao reitor da Missão Católica Polonesa, que havia vindo especialmente para essa solene Missa da distante Porto Alegre, bem como ao grupo dos polônicos de Virmond.
Após a solene bênção, em poucas palavras o sacerdote que presidiu a Missa celebrada apresentou aos fiéis brasileiros a espiritualidade mariana dos católicos poloneses e polônicos, que expressam a sua profunda devoção a Nossa Senhora de Monte Claro, da mesma forma que os brasileiros expressam a sua honra à Senhora de Aparecida. A seguir entoou em polonês o cântico “Negra Madona”, que foi acompanhado pelos polônicos que haviam vindo de Virmond especialmente para essa solenidade.
Logo após a Missa foram convidados ao próximo salão paroquial os organizadores desse evento e as pessoas vindas de cidades distantes, como Porto Alegre e Virmond, para participarem de um jantar comum, durante o qual foram servidas pizzas de variados sabores. Foi a ocasião para novos diálogos amigos e para o conhecimento comum entre os participantes desse simbólico festim.
Em razão da adiantada hora da noite, e principalmente dos frequentes ataques de bandidos nas ruas da cidade, o pároco local me levou ao hotel, onde ainda por algum tempo pude refletir a respeito daquele acontecimento religioso e cultural que havia sido organizado pelos brasileiros locais, com o propósito de apresentar à sociedade a figura de um polonês que com limitadas possibilidades financeiras foi capaz de realizar com fascinação três expedições científicas ao Paraná. Quando lhe faltou dinheiro, ele interrompeu as pesquisas na mata e trabalhou como professor numa escola polonesa em Antônio Olinto.
Eu gostaria de assinalar, para finalizar esta reportagem, que, enquanto esteve no Paraná, Tadeusz Chrostowski manteve frequentes contatos com os colonos poloneses. Após a volta de uma das suas expedições, ele publicou na Polônia um livro com o título Paraná, dedicado não apenas aos resultados das suas pesquisas, mas que também descrevia a situação e as condições de vida dos colonos poloneses.
Estou convencido de que valeu a pena empreender o esforço de uma viagem à distante Foz do Iguaçu para celebrar uma Missa pelo cientista Tadeusz Chrostowski, o qual – em meio a outros pesquisadores, religiosos ou construtores de ferrovias poloneses que em grande número trabalharam em diversas áreas de vida deste país – gravou o seu nome com letras de ouro nas páginas da história do Brasil e legou à Polônia a honra pelas importantes pesquisas que promoveu nas tropicais matas paranaenses. Zdzislaw Malczewski SChr
Ver esta matéria em polonês no site da Agência Polonesa de Informações
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