quinta-feira, 21 de maio de 2020

O dia em que quase mataram o padre Guilherme Maria Thiletzek em Ponta Grossa

Monsenhor Guilherme

Monsenhor Guilherme em Foz do Iguaçu é o nome de uma avenida no jardim São Paulo que liga a Praça da Bíblia com a Avenida Felipe Wandscheer na altura do Cemitério Municipal que tem o mesmo nome do bairro. Monsenhor Guilherme é também o nome de um Colégio Estadual criado em 1950 por decreto do governador Moisés Lupion, inaugurado  em 1952 pelo governador Bento Munhoz da Rocha e finalmente mudado para a atual sede em 1965 já no governo de Paulo Pimentel.

Como ninguém nasce monsenhor, o jovem Guilherme, após sua ordenação como padre em São Gabriel (RS) em 1907*, teve que exercer o sacerdócio começando de baixo. Assim, o jovem padre aparece na história já em Curitiba e Ponta Grossa - região formada por um grande número de colônias: italianas, alemães, polonesas, ucranianas e sua variedades internas como alemães russos, polonêses-alemães que refletiam a formação das terras de origem onde territórios eram invadidos, dominados, subjugados segundo os ventos da política e geopolítica da Europa.

O padre Guilherme nasceu na Alemanha em 1882. Onde exatamente, não tenho informação. O nome Thileczek ou Thiletzek denuncia, a etnia do padre como polonesa e o primeiro nome Wilhelm (Guilherme) denuncia sua afiliação com a alemanha já que nascera e houvera sido  educado na Alemanha ou na Polônia ocupada. Esse trânsito cultural entre Alemanha e Polônia na  vida do jovem padre fortaleceu o currículo dele perante as autoridades eclesiásticas. Por isso já trabalhando na região de Curitiba, o jovem padre foi enviado para Ponta Grossa para substituir um padre polonês na Colônia Polonesa. O nome do padre que saiu era Woloszewicz. Por algum motivo, o padre Woloszewicz tinha caído em desgraça com a congregação que não queria mais vê-lo por perto.

Assim o jovem padre Guilherme assume a igreja e começa a ministrar e pregar na Igreja dos Poloneses. Mas como a época era não só politizada como polarizada logo apareceu desavença. Algumas lideranças se dedicavam a encontrar defeitos  no novo padre. A primeira acusação era que ele não dominava o idioma polonês. Como o padre era da Congregação do Verbo Divino, de origem alemã fundada na Holanda, suas vestes ou seus paramentos traziam palavras escritas em letras góticas o  que configuraria o padre como alemão ou como se diz no linguajar da polarização de hoje como pró-alemão. Para piorar, jornais de Curitiba publicaram "fofocas"  sobre a falta de habilidade do padre com a língua polonesa o que pôs mais fogo na fogueira. 

A professora Rosângela Wosiack Zulian, Doutora em História Cultural pela Universidade Federal de Santa Catarina e professora Adjunta do Departamento de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa, conta em um artigo  intitulado Bêbados, arruaceiros e sovinas: a Igreja Católica e o imaginário imigrante no início do século XX em Ponta Grossa:

"O líder desta manifestação era o senhor Pinkowski, chamado na crônica de estaroste (algo como “maioral”), e que estava indignado por não ter sido consultado a respeito. Declarou publicamente que o novo sacerdote seria “liquidado a bala”. Assim, no domingo pela uma hora da tarde, quando na igreja dos poloneses iria começar a reza com o Santíssimo exposto, a Rua 15 encheu-se de mulheres e crianças e homens também – todos poloneses. Juntaram-se para tirar o padre e o proteger do Pinkowski. Este, armado com seu revolver, dirigiu-se à Igreja dos poloneses. Aí, teve que se haver com as mulheres. Cercaram-no de todos os lados acotovelando-se, xingaram-no de cachorro e de outros títulos do repertório.Pinkowski defendia-se e revidava [...].Enfim, as polonesas foram às vias de fato, abriram uma saraivada de cacos detelhas [...]. Pinkowski, aos trancos e barrancos, foi abrindo caminho, com as mãosfoi protegendo a cabeça, e “pernas paraque vos quero!” [...]. O padre nunca mais foi importunado".
Monsenhor  Guilherme no Marco das Três fronteiras, o segundo sentado à esquerda (Memória Rondonense) 

De Padre a Monsenhor

O que o padre Guilherme fez entre os dias  de Pinkowski até sua designação como o primeiro prelado da primeira prelazia do Paraná precisa ser pesquisado. Como conta a professora Olívia Schimmelpfeng, o  padre Guilherme Thiletzek chega em Foz do Iguaçu em 1922 enviado pelo bispo de Curitiba, Dom João Francisco Braga, com a  missão especial de "visitar antiga Colônia Militar e dar informações minuciosas a respeito da nova Comarca recentemente criada em Foz do Iguassú e do seu movimento religioso. Este sacerdote desempenhou fielmente a sua missão referindo ao zeloso e santo Bispo Diocesano de Curityba tudo o que via e ouvia em Foz do Iguassú.

A dissertação de mestrado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa da professora Selma Antonia Pszdzimirski Viechnievski, com o título "Tensões na Construção Identitária Polonesa: o Caso da Colônia Amola Faca / Virmiond (PR), dá uma luz sobre as andanças do futuro Monsenhor Guilherme.

O trabalho registra a passagem do futuro prelado de Foz do Iguaçu pela colônia Amola Faca, na atual cidade de Virmond no dia 25 de novembro de 1921. O padre Guilherme e os padres João Gualberto Pogrzeba e Pedro Halama acompanhavam o bispo diocesano de Curitiba Dom João Francisco Braga. É possível que tenha sido nessa viagem, o bispo tenha mandado o Padre Guilherme fazer a pesquisa sobre Fóz do Iguassu, a antiga Colônia Militar onde chegou em 1922. O bispo estava temporariamente estabelecido na região de Laranjeiras fazendo crismas.     

Quatro Anos mais tarde
Em 1926 acontece uma reorganização da estrutura administrativa da Igreja no Paraná. Graças à Bula (decreto) "Quum in Dies Numerus", de maio daquele ano, o Paraná deixou de ser parte da Arquidiocese de São Paulo, e eleva a  até então Diocese de Curitiba ao status de Arquidiocese de Curitiba. Reza a bula:

“Desligamos em primeiro logar, e para sempre subtraimos do direito metropolitico da Igreja Archiepiscopal de São Paulo a actual diocese de Corityba, que daquela Igreja foi até agora sufragânea”.

Em seguida a Bula do Papa Pio XII, prossegue:

“Declaramos em seguida, dividido em quatro partes o território da diocese até hoje de Corityba; a esta, depois de revestida do caracter Archiepiscopal como abaixo se há de dizer, assignamos uma dessas partes, e nas outras tres partes erigimos as novas Dioceses de Ponta Grossa, e de Jacarezinho e a Prelazia da Fóz do Iguassú que independerá de outras dioceses”.

A partir desse decreto, o arcebispo de Curitiba tomou as providências para enviar um prelado para encabeçar a direção da nova Prelazia de Foz do Iguaçu. O escolhido foi o Padre Guilherme. E a partir daqui começa a vida do Monsenhor Guilherme  Maria Thiletzek, tal qual a conhecemos em Foz do Iguaçu. Vale a pena dizer que o Monsenhor Guilherme  é de máxima importância para o Oeste do Paraná especialmente para Toledo e Cascavel. Procurando o nome Guilherme Maria Thiletzek no Google, ora ele vai aparecer ligado à história de Toledo, de Cascavel, de Foz do Iguaçu, Guaíra e Marechal Cândido Rondon.



Nota
Levantar a vida de personagens importantes na construção do Paraná como o Padre Monsenhor Guilherme ajuda a expandir a visão que temos dele e para ajudar na formação do argumento para a criação de roteiros turísticos regionais, especialmente após a época da epidemia quando o turismo regional precisará segurar a barra até que as coisas melhorem.     





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