quarta-feira, 23 de setembro de 2020

O Brasil venceu e a paz chegou. Mas, a terra é Paraná ou Santa Catarina? (Nova Guerra)

O Paraná fazia fronteira com o Rio Grande do Sul (clique na foto para ampliar)

Com a solução do problema da Argentina, tudo ficou resolvido. As terras de Palmas eram brasileiras e a paz iria reinar, certo? Errado. Não basta as terras serem brasileiras. A questão era: Paraná ou Santa Catarina? Essa história faz de Dionísio Cerqueira e Barracão serem um dos "destinos turísticos" singulares do Brasil. Além de serem sede dos marcos internacionais da Fronteira Brasil-Argentina, os dois municípios são sede também de marcos de fronteiras estaduais e municipais. E não são marcos simples de demarcação de limites entre estados. São marcos monumentos que celebram o fim do conflito Paraná-Santa Catarina. O conflito com a Argentina foi resolvido em 1895. O Marco Grande da Tri Fronteira foi colocado no lugar em 1903, mesmo data que o de Foz do Iguaçu, Puerto Iguazu, Santo Antônio do Sudoeste e Capanema. 


Detalhe do Mapa que mostra a "Zona Invadida pelos Catharinenses" 

 

Mas em 1912 explodiu o conflito Paraná Santa Catarina. Uma vez o território estava livre, o Paraná considerava ter fronteiras até o rio Uruguai ou, em outras palavras, com o Rio Grande do Sul. O que significa até Itapiranga. Foi uma guerra feia.                      

 Até 1853 não existia Paraná. O que existia era a província de São Paulo. Paraná era parte de São Paulo. A fronteira da Província de São Paulo com a Província do Rio Grande do Sul era o rio Uruguai. Quando  o Paraná se emancipou de São Paulo, a nova província queria manter o antigo território de São Paulo. Na cabeça do Paraná não havia espaço para Santa Catarina. Na cabeça do Paraná, ainda, a Província de Santa Catarina começava quase em Florianópolis. São Francisco do Sul, seu porto era Paraná. Partindo de Florianópolis para o interior , a fronteira ficava logo depois do que hoje é Blumenau.        

Até 1912, quando começou a Guerra Santa Catarina-Paraná, todas as terras do interiorzão do Paraná e Santa Catarina estavam nas mãos da empresa Estrada de  Ferro São Paulo-Rio Grande (FSPRG). Após o fim do conflito Brasil/Argentina, o Paraná não acatou a decisão do Supremo Tribual federal que dera ganho de causa a Santa Catarina em 1904. O trecho seguinte é do site da Assembleia Legislativa do Paraná, por ocasião da comemoração dos 100 anos do Acordo de Paz entre os dois estados celebrada em 2016 baseado na palestra do presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná e desembargador aposentado do Tribunal de Justiça, Paulo Roberto Hapner.

"As terras abrigavam uma rica floresta e extensa plantação de erva-mate. Abastados fazendeiros que acumulavam extensas áreas e assim se tornavam proprietários, pressionavam agregados e posseiros para que deixassem o local. A situação se agravou com a chegada da empresa americana Brazil Railway Company, comandada pelo megaempresário Percival Farquhar, com o intuito de construir a estrada de ferro São Paulo-Rio Grande do Sul. Ali ele instalou a maior madeireira da América do Sul na época e uma companhia colonizadora que, após o desmate, venderia os lotes a imigrantes europeus. Concluídas as obras, cerca de oito mil operários foram dispensados e famílias que moravam nas terras adquiridas pela companhia tiveram que deixar o lugar. 

 A partir daí o conflito só se intensificou, juntando antigos seguidores do monge peregrino José Maria de Santo Agostinho com descontentes em geral, colonos expulsos, fazendeiros que se opunham aos coronéis da época, tropeiros sem trabalho, desempregados da ferrovia e até ex-combatentes da Revolução Federalista (1893-1895). Segundo o historiador Paulo Pinheiro Machado, autor do livro “Lideranças do Contestado”, num determinado momento o litígio tornou-se uma guerra de pobres contra ricos: “Uma guerra daqueles que queriam formar suas comunidades autônomas, onde todos viveriam em comunhão de bens, o que era uma negação da própria ordem republicana, da concentração fundiária, do poder dos coronéis da Guarda Nacional e da força da polícia, do Exército e da companhia ferroviária sobre eles”.

Depois do acordo, veio a partilha considerada favorável aos catarinenses, que ficaram com 28 mil dos 48 mil quilômetros quadrados da área reivindicada. O acordo foi assinado no Palácio do Catete no Rio de Janeiro no dia 20 de Outubro de 1916.  

Isso significa que quando Santos Dumont passou por Foz do Iguaçu em abril de 1916 e foi recebido dias mais tarde pelo Presidente do Paraná, Affonso Alves Camargo, o Paraná ainda estava em guerra. Foi nessa ocasião que Affonso Alves Camargo assinou o Decreto que desapropriava terras de Jesús Val da antiga Colônia Militar que circundavam as Cataratas do Iguaçu pelo lado brasileiro. 

Para saber mais sobre a Guerra do Contestado assista este documentário do jornalista Dirk Lopes da Silva com entrevistas a historiadores, sobreviventes e apaixonados pela história   

(Esta publicação está  ligada à matéria "Onde estão os marcos das Três Fronteiras da fronteira Brasil-Argentina?) 

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