sábado, 21 de agosto de 2021

Catedral Nossa Senhora de Guadalupe em Foz do Iguaçu (Segunda Parte): Inspiração, Símbolos, origem do nome, quem escolheu o quê?

 

Um projeto inpirado np formato de uma Cruz Grega

Eu não sei se quem projetou a Catedral Nossa Senhora de Guadalupe, neste caso o Sr Emilio Benvenutto Zanon, começou sua visualização de baixo para  cima ou de cima para baixo.  Para criar esta postagem, eu vou começar de cima. A gente tem de começar de cima.

Como explica a literatura de divulgação da Diocese de Foz do Iguaçu, a inspiração para a concepção da Catedral foi a Cruz Grega. Embora cruz seja cruz e todas remetam ao mesmo destino, a diversidade humana criou diferentes representações de cruzes.

A Cruz está fixada no topo de uma estrutura cilíndica 

Na Cruz Grega(
)todos os braços possuem o mesmo tamanho, tanto o horizontal como o vertical. A cruz latina (), a mais conhecida no cristianismo de rito ocidental tem o eixo vertical mais cumprido que o braço horizontal. Há outras formas de cruz como a Cruz de Lorena (), Cruz Missionera ou Cruz Jesuíta muito importante para Foz do Iguaçu que não deixa de ser parte de um circuito turístico cultural do Mercosul chamadado “Rota das Missões” e está ligada à história das Missões Jesuíticas. Não esqueçamos que povoações jesuítas como San Ignacio Mini, San Ignacio Guazú que hoje estão na Argentina e Paraguai começaram no que hoje é Paraná.

Mas voltemos à Cruz Grega na Catedral aqui mostrada na foto de Jean Pavão (1ª foto) para o Visit Iguassu trazendo o telhado para o primeiro plano de nossa observação. Podemos ver que a construção cruz grega se aloja no terreno transversalmente o que corresponde à orientação do trajeto do sol durante o dia. É como se o sol passasse o dia atravessando o eixo da nave principal da Igreja. Citando Dionísio Areopagita, o folheto de divulgação da catedral, afirma:"O Sol, especialmente, possui a significação e a imagem de Deus. Pela porta maior, penetra a glória do senhor nos templos". E explica: O cristo e o Sol .... traz a noção de Cristo como a Estrela-maior e guia da Humanidade. Gostou?

Trevo de quatro folhas (Trifolium repens), Domínio Público (Wikipedia)

Graças à fotografia aérea é possível ver duas estruturas em forma de cruz grega. A primeira, e a maior, corresponde ao telhado principal e à igreja como um todo. A segunda é uma cruz grega menor que  lembra um trevo de quatro folhas como este trevo branco (Trifolium repens), na foto logo acima. Aqui é necessário fazer um alerta: ao destacar a estrutura “trevo de quatro folhas” no topo da Igreja e sua semelhança com uma Cruz Grega, este texto não compromete o simbolismo oficial da Catedral atribuindo qualquer significado ao formato adotado e sua relação com a crença, quase universal, de que o trevo de quatro folhas (🍀) seja um símbolo de boa sorte. 

A Cruz Grega estilo Trevo de Quatro Folhas como parte do telhado da igreja segue o mesmo padrão do teto maior com orientação do centro para fora e para o alto e do nascente para o ponte. 

No centro, no encontro das quatro pétalas desse trevo ou cruz grega, parte a estrutura cônica onde no topo dela está a cruz (latina, você já sabe o que é, nè?). Desde a base desta estrutura cônica, o formato que predomina é o círculo e lá no topo da torre, a estrura termina em um círculo menor.  Do centro desse círculo parte a cruz em direção ao alto ligando o que está na terra com o que está nos céus. E esse formato circular é aleatório?

“Foi me dado contemplar o brilho maravilhoso da roda ... em sua consciência e onipotência a Divindade é igual a uma roda, um círculo, um todo, que não pode nem ser entendido, nem dividido, não tendo princípio nem fim” ─ Santa Hildegarda de Bingen (1098 – 1179)

A citação acima é da profetisa, escritora, compositora. visionária e mística católica Hildegarda de Bingen, canonizada por decreto papal 900 anos após sua morte em 2012. O círculo entre outras coisas representa o que não termina e nunca começa. O simbolismo da torre da Igreja onde o círculo e a cruz se encontram. 

O conjunto Círculo e Cruz no centro da cruz grega forma a figura de uma coroa. Essa coroa representa, em primeiro lugar, "o Cristo Rei do Universo". Em segundo, "a grande devoção católica à Maria, Rainha do Céu e da Terra". O pequeno círculo, em si, na base da cruz, "representa a perfeição e a eternidade de Deus além de trazer à mente a existência da Grande Aliança de Amor de Deus com a Humanidade".   

Faltando encaixar a última parte do segundo nível do telhado e do terceiro nívela a parte da "pétala" da estrtura "trevo-de-quatro-folhas"   

 

O Véu, parte do manto de Nossa Senhora de Guadalupe (Cora Evans)

 

O telhado em três níveis

Como a gente começou este texto de cima, vamos contiunar descendo para entender a simbologia da Catedral Diocesana de Foz do Iguaçu. A forma curva do telhado foi pensada para representar ou trazer à mente a Santíssima Trindade, as Cataratas do Iguaçu lembrando a forma geral da queda de alguns saltos das Cataratas. Permita-nos fazer um pequene parêntese. O que vou dizer agora é coisa minha, de novo aviso, não compromete a Igreja; é parte de como eu enxergo o mundo. Deixe-me reforçar,  por exemplo, a beleza do Salto União, um dos muitíssimos saltos das Cataratas do Iguaçu (há quem diga que são 175, outros que são 275. Eu nunca contei e não conheço quem tenha contado até por que afinal, o que é um salto? Onde começa e termina o outro?). O Salto União é pequeno mas tem uma aura toda sua. Em vazão normal ele não chega a um metro de largura no topo dele, no primeiro nível, dele. Logo abaixo, no segundo nível ele se alarga para unir-se, no terceiro nível, ao salto ao lado, fundir-se com ele. Detalhe:  o salto ao lado, à direita, se chama Garganta do Diabo. É o salto que marca a fronteira entre o lado brasileiro e o lado argentino, entre Foz do Iguaçu e Puerto Iguazu, entre Paraná e Misiones e entre Brasil e Argentina. Por isso ele foi batizado como União ou Unión.

Salto União, salto que cai no formato que especialistas de língua inglesa chamam de "three-tiered waterfalls" (cachoeira em três etapas ou ainda cachoeira estilo "organograma")

Do mesmo jeito, o telhado da Catedral cai e cascateia em três níveis. O primeiro nível do telhado, o maior, para quem olha do solo,  representa o véu que cobre a cabeça e moldura o rosto de Nossa Senhora tanto na aparição como Nossa Senhora de Guadalupe como na maioria de outras aparições.

Estola

O nível intermediário do telhado lembra o papel intermediador entre o céu e a terra do sacerdote na celebração da missa. A figura do segundo nível do telhado lembra a "estola", aquela peça da vestimenta de um sacerdote usada na celebração da missa, no oferecimento dos  sacramentos e durante a Eucaristia. 

O terceiro nível já comentado na descrição da torre da Igreja é o que culmina com o círculo e a Cruz. 



Setas ilustram os níveis do telhado (clique para ampliar)


Integração como bandeira

Como sendo a "Três Fronteiras"* mais movimentada do Brasil, o tema central da área internacional é a integração. Todos os níveis da vida cidadã das Três Fronteiras está ligado à integração: Três Moedas, Três Bandeiras, Três Países, Três idiomas oficiais locais (Espanhol, Português e Guarani), Três Marcos, Três Padroeiras e logo teremos Três Pontes com nomes que evocam e celebram a Amizade (1965), Fraternidade (1985) e, de novo, a Integração (em construção).  

Foi exatamente para que a nova Catedral se integrasse neste espírito que Nossa Senhora de Guadalupe foi escolhida para ser a Padroeira da Diocese localizada na região trinacional, de cultura plurinacional  que tem governo sobre 27 paróquias em 15 municípios do Oeste do Paraná, mais especificamente na região lindeira ao lago de Itaipu que é Binacional, mas que, durante as negociações para o uso do rio Paraná teve ínúmeras reuniões trinacionais ou tripartites.       

O currículo da Virgem de Guadalçupe, por si só dispensa apresentação: Padroeira do México e de Toda América Latina. Em 1979 durante sua visita ao México o Papa João Paulo II lembrou e confirmou a proclamação de seus predecessores Benedicto XIV e Pio X de Nossa Senhora de Guadalupe como a Padroeira do México e de Toda América Latina (A Homilía).   

 

Idiomas: que palavra é essa?

De todas as etnias residentes em Foz do Iguaçu e região Trinacional,  nenhuma está potencialmente melhor preparada para entender o sigificado da palavra Guadalupe, do que a comunidade árabe predominantemente libanesa. E por quê? Porque a palavra Guadalupe vem do árabe e mais especificamente do dialeto árabe-andalusino que era a variante árabe falada na Península Ibérica durante os 900 anos que durou a ocupação islâmica na Espanha.
   

Wádī al-Lúp (وادي اللُّبّ) origem da palavra Guadalupe em árabe da Andaluzia (há outras versões)

O pequeno Rio Guadalupe espanhol ainda continua correndo em seu pequeno trecho de mais de 40 quilômetros na província de Cáceres na Região Autônoma de Extremadura. Foi nele que no século 12, um "boiadeiro" espanhol recebeu a visita de Nossa Senhora que lhe instruiu a ir até um ponto na beira do rio Guadalupe e desenterrasse uma imagem dela que havia sido escondida lá anos antes. O boiadeiro,  na realidade vaqueiro, Gil Cordero foi ao local e encontrou a imagem que logo ficou conhecida como a Nossa Senhora Santa Maria de Guadalupe e se tornou padroeira da Espanha, ao ponto de, Cristóvão Colombo, seu devoto, ter dado o nome dela a umas ilhas que "descobriu" no Caribe nos anos 1490s. Assim sendo, a NS Guadalupe "extremeña" (natural de Extremadura) do rio Guadalupe, Espanha não é a Virgem de Guadalupe padroeira da Diocese de Foz do Iguaçu, Padroeira da América Latina e de todo latino-americano e latino-americana.

A Nossa Senhora de Guadalupe apareceu quatro vezes no Monte Tepeyac, no México ao índio Juan Diego Cuauhtlatoatzin em 1331. Falando em Nahuatl, língua falada até hoje, ela pediu uma coisa muito difícil a Juan Diego: que batesse na porta do bispo e contasse a ele que ele havia visto Santa Maria e que ela mandou um recado no sentido de que fosse construída uma capela no monte onde se encontraram. Esta história pode ser conferida em outras fontes. Por enquanto nos concentremos na parte linguística da origem americana do Guadalupe. Antes do cristianismo chegar, infelizmente trazido com muita violência, os aztecas tinham uma deusa que se chamava Tonantzin no monte Tepeyec. Depois de chegarem na Nova Terra, os espanhóis destruiram o santuario à Tonatzin. Mas os devotos continuaram usando o nome Tonantzin como título para a Mãe de Cristo. Ao título Tonatzin foi a crescentada a palavra Coatlaxopeuh que é de onde vem o nosso Guadalupe. Agora faça uma pausa e pronuncie devagar a palavra Coatlaxopeuh.  Koat-la-xôpe. Consegue ouvir um "guadalupe" aí nesses sons.       

Três Escolhas Importantes

O nome

Foi em uma reunião extraordinária em Medianeira (PR), cidade cujo nome é parte da devoção à Nossa Senhora Medianeira que a Comissão* à frente do esforço de construção  da futura Catedral teve que escolher um nome tato para a catedral em si, como para a Paróquia que estaria associada à nova Catedral. Sobre a mesa, a comissão tinha várias sugestões:     Santíssima Trindade, Nossa Senhora de Guadalupe, Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora de Lourdes, Nossa Senhora da Paz, São João Batista, o nome da antiga Catedral, atual Matriz e do padroeiro de Foz do Iguaçu e São José Operário. Quando a reunião terminou, Nossa Senhora de Guadalupe tinha sido a sugestão que venceu por voto de todos os participantes.

O terreno

Quando a ideia da construção da Catedral começou finalmente a sair do papel, as lideranças eclesiáticas e da comunidade tinham a possibilidade de construir a futura catedral em quatro terrenos diferentes. Uma das primeiras possibilidades era construir a futura e nova catedral no terreno onde já estava a  Paróquia São João Batista. Essa possibilidade para ser concretizada necessitaria a demolição da estrutura histórica. Demolição da antiga Catedral, nem pensar! Foi a reação da época e a ideia foi engavetada. A segunda possibilidade seria no local e redondeza da Paróquia São Paulo Apóstolo na Vila Maracanã onde também está localizada a Cúria Diocesana. O espaço não era grande e a ideia poderia terminar em mais um caso de vestir um santo dispindo outro. Arquivada, pelo qual a paróquia agradece. A terceira possibilidade era cionstruir sobre um terreno na Avenida Costa e Silva. O terreno se encontra na área separada para ser o Centro Cívico de Foz do Iguaçu, começando da Avenida Paraná, indo até a Avenida José Maria de Brito  e adjacências onde todos os órgãos de governo estarão reunidos: 6ª SDP (polícia civil) IML, INSS, Receita Federal, Hospital Municipal, Detran, Polícia Federal, Rodoviária, Fórum Eleitoral entre outros incluindo a Prefeitura de Foz do Iguaçu que será, parece, a última inquilina a chegar. 

Mas esse terreno foi excluído da lista por um problema de duas índoles segundo destacou o bispo Dom Laurindio Guizzardi (In Memoriam): um de ordem técnica e outro moral. É que o lado da Avenida Costa e Silva oposto ao terreno da futura Catedral é parte de uma área não oficialmente denominada "setor de motéis". Na época das discussões, começaram os trabalhos de construção de um novo motel o que significou protestos da comunidade pró-construção da catedral. 

"O terreno próximo à rodoviária, por sua vez, estava situado numa baixada sujeita a aluviões, e cercadas de lugares mal afamados", escreveu Dom Laurindo Guizzardi em sua "História da Diocese de Foz do Iguaçu". 

Sobrou, por exclusão de todos os outros, o terreno da Vila A que pertencia a Itaipu Binacional e que foi cedido em base de permuta com a Prefeitura em negociação apoiada pelo então Diretor-Geral Brasileiro da Binacional, Euclides Scalco (In Memoriam). O resto da história, você já sabe.    

Da construção 

Assim como foi necesário escolher o terreno, o nome da Paróquia / Catedral logo veio a necessidade de escolher uma empresa para levar a cabo a execução do projeto arquitetônico abençoado pelo Papa João Paulo II. Na mesa a comsissão  trabalhava com as ofertas de quatro empresas: Consmetal (Santa Terezinha de Itaipu), Vaspa (Cascavel), Camemol (Piracicaba, SP) e Sorocaba Ltda (SP). No final nenhuma foi escolhida devido a que as propostas eram mais altas em termos de custos do que a comunidade pensava. Graças à informação de boca a boca do setor da construção apareceu a empresa Beton Steel Ltda de Toledo (PR) que fez uma proposta atraente e foi contratada.  

As fotos que seguem são do acervo da Benton Steel contratada para fabricar e montar a estrutra de aço que sustenta o telhado. Se vê na foto logo abaixo um trabalhador sobre a estrutura em forma de círculo que será responsável pelo formato da torre da Igreja, que neste projeto é uma estrutura cilíndrica com muito significado e simbolismo. 

Montagem da Torre da Igreja

Montagem do telhado: emaranhado de ferro foi uma grande atração para quem passava pelo canteiro de obras e tentava entender o que sairia dali

 ** A Comissão

Dom Laurindo Guizzardi, Dom Olívio Fazza, Padre Cláudio Inácio Güntzel, Paulo Pucinelli Filho, Altino Voltolini, Paulo Furlan Neto, Antônio Paulo Galvão Natucci, Antônio Manuel de Albuquerque, Ney Afonso Chassot, Laudelino Pacagnan, Valtair Tripiana, Andrea David, Rosita Chassot, Reinaldo Guimarães

Nota

Emilio Benvenuto Zanon, arquiteto prático (que não  tinha curso superior), pintor de vitrais e construtor de igrejas não era nenhum desconhecido da Igreja no Oeste do Paraná. Ainda nos 1970, ele foi escolhido, na época do Padre Germano Lauck para fazer uma reforma na Catedral São João Batista além de ter participação em igrejas de vários municípios como São Mgiuel do Iguaçu. A informação será atualizada. (Primeira parte desta postagem)         


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