Francy Xavier Filha de Francisco Xavier Pereira In Memoriam |
"Na época que aconteceu o acidente a minha mãe ficou grávida de mim ... essa companhia aérea tirou todos nossos sonhos de ter pai presente nas nossas vidas, nem sequer tive a oportunidade de conhecer meu pai" - Francy Xavier
Recorte amarelado de jornal enviado pela filha de Francisco Xavier Pereira, o sétimo nome na lista de 22 passageiros de Eirunepé |
Por Jackson Lima*
Este texto é uma homenagem às vítimas e familiares do acidente do avião da TABA (Transportes Aéreos da Bacia Amazônica), Modelo Hirondelle prefixo PT-LBV na manhã de sábado, dia 12 de junho de 1982.
O voo tinha partido de Eirunepé, uma pequena cidade do interior do Amazonas com destino a Manaus via Tabatinga e Tefé. Havia 44 pessoas abordo. Todos faleceram. Eu poderia ter sido a vítima número 45 caso tivesse chegado dentro do meu horário para abrir a banca (box) de um amigo que vendia produtos amazônicos entre eles pó e bastão de guaraná. Eu aproveitava e vendia também excursões para algum turista estrangeiro. Neste dia cheguei muito atrasado. Embora o voo de Eirunepé não trouxesse turistas estrangeiros eu mantinha o ritual.
O dia estava claro mas o céu estava coberto com nuvens baixas como se fosse cerração. Sem dúvida quem estivesse abordo do avião não veria o chão. Eu morava na casa do amigo Saburo Ueda, dono do box, na área do INCRA próximo ao Igarapé Urumutum. Eu ia a pé de casa até o aeroporto. Uma boa distância. Tenho vaga lembrança que ouvi o ronco do avião voando "dentro das nuvens" e dando voltas a partir do momento que entrei na Avenida da Amizade que ligava na época o Aeroporto de Tabatinga com o Aeroporto de Letícia, Colômbia.
Fiquei agitado e apressei os passos para não chegar muito tarde no aeroporto. Continuei escutando o avião fazer longas voltas e me parecia que cada vez mais baixo. Antes de chegar à área militar, sede do 8º BIS (Batalhão de Infantaria de Selva) já passado o Hospital de Guarnição na altura do rio Brilhante, alguma coisa me fez ter um pressentimento ruim. Foi quando passou um caminhão do Bombeiros Voluntários de Letícia, Colômbia. Não me chamou a atenção porque era um caminhão pipa.
Minutos depois já no trecho final da caminhada passa um segundo caminhão do Corpo de Bombeiros de Letícia. Vi que em pé, uniformizados e agarrados naquele suporte para carregar os profissionais estavam o amigo Alberto Rojas Lesmes, o KAPAX e a Diva Smith que mais tarde chegou a ser minha chefe em uma empresa de turismo de Letícia. O Kapax gritou e me mandou correr. Comecei a correr. Quando cheguei na última curva já para virar em direção ao estacionamento do Aeroporto avistei a pior visão que tinha visto ate então em minha curta vida. Eu ainda não tinha 30 anos. O Kapax me recrutou na hora para ajudar no resgate.
O fogo já tinha sido apagado pelo primeiro caminhão e a equipe do Aeroporto que também tinha um caminhão. Só saia uma fumaça de várias partes da fuselagem. Sofro uma espécie de amnésia sobre o que vi, quanto vi e que senti no processo de salvar. Só não esqueci uma criança que achei e fiz esforço de tirá-lo dos escombros. Ele não parecia ter se machucado e eu senti muita alegria quando gritei pedindo ajuda dizendo que havia um sobrevivente. O corpo estava inteiro menos a parte de trás da cabeça. Só notei isso quando passei o menino para um bombeiro que não sei se era brasileiro ou colombiano, do Exército Brasileiro, da defesa Civil Colombiana ou da Infraero. A essa hora estava aumentando o número de ajudantes. Passei mal e fui retirado do ambiente para recuperar dentro do aeroporto.
Foi nesse momento que percebi que o meu box (o balcão), aqueles oficialmente concessionado pela Infraero, havia sido destruído. Um pneu do avião se soltou, atravessou a parede do edifício do aeroporto, destruiu a minha banca, atravessou o estreito saguão, destruiu o balcão do Correio Aéreo Nacional (CAN), atravessou mais uma parede, atravessou a pista e foi parar no gramado no lado exterior da pista. Só aí entendi que meu atraso me salvou.
Depois de recuperar a equipe me deu tarefas mais leves como fotografar e documentar a atividade. Um filme foi entregue às autoridades brasileiras e outro foi entregue a um piloto da Cruzeiro do Sul que fazia a rota Iquitos - Manuas via Tabatinga e Tefé. A partir daí o sol brilhou mas como se estivesse sob a influência de um eclipse. Um dia triste. Quando um golpe é muito duro, as pessoas parecem que não digerem, não falam, os tabatinguenses não falavam sobre o assunto. Não acompanhei o trabalho oficial mais tarde e o resgate já a cargo da Força Aérea. E não sei como voltei para casa.
Algumas Fotos e contexto
Este caminhão tanque chegou primeiro. Pode-se ler nele BOMBEROS em espanhol. Avião caiu na área de estacionamento |
Notícia no Estado de São Paulo do dia 13 de junho de 1982. Um dia depois do acidente |
Matéria no Jornal do Brasil do dia 14 de junho já traz a manchete: Comandante do Hirondelle é acusado de causar o acidente |
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